domingo, 26 de fevereiro de 2023

Super Sandro

 

"Neste sábado (25), a emoção tomou conta do Centro de Futebol Zico, no Recreio dos Bandeirantes, com a entrega de uma cadeira de rodas motorizada para Sandro Rilho.

A ação, realizada pela FlaResende e FlaCampos, duas embaixadas espalhadas pelo Brasil vermelho e preto, tem o objetivo de facilitar a locomoção diária do nosso querido Sandrão.

A partir de agora, o semovente rubro-negro que é um notório colaborador para a memória do clube, poderá realizar visitas às sessões de fisioterapia sem gastar tanta energia, desprender o suor imerecido do rosto áspero com a barba por fazer e não mais pensar em desistir como imagino que em muitas vezes tenha encenado o ato.

Não, Sandrão, o jogo não acabou e muito menos é hora de entregar os pontos.

São 90 minutos. Tudo pode acontecer. 

É você contra sua (por enquanto) limitação. É você disputando a bola contra o carrasco do desânimo, do marcador implacável chamado depressão, do zagueiro viril chamado tristeza.

O adversário é forte. O time deles quer anular você, porque sabe que você decide, é craque e é o cara.

O jogo é truncado, estudado, estratégico, marcação em cima e não tem o VAR para elucidar lances duvidosos.

Não esmoreça com o que está ao seu redor.

Não se enfraqueça por palavras negativas de quem não venceu a morte como você venceu.

Não se desfaleça. Muitos planos e projetos Deus tem para a sua vida.

Não permita-se desbotar o brilho que existe em seus olhos e que se torna lindo quando um busto é inaugurado ou  uma outra ação qualquer é realizada pelo FlaNação.

Você não está sozinho nessa. Pergunte ao Raul se foi fácil ser o goleiro que foi na história rubro-negra tendo que aturar os insultos e xingamentos atrás do gol vindos da torcida adversária?

Fala para o Leandro, que jogou no clube que tanto amou por 12 anos convivendo com o Mal do Cawboy nas pernas, que você pensou em desistir do jogo.

Explique para o Marinho - que faz 68 anos na segunda-feira (27) - e o Lico, que saíram de Londrina e Joinville apostando apenas no talento deles para vencer no Flamengo, que você não creu que venceria a batalha  ao derrotar o Covid-19.

Desabafe com Junior e Andrade que você ficou longe de muitas pessoas que te amam enquanto esteve em coma, no entanto, não esqueça que o Maestro ficou longe cinco anos no futebol italiano e o Tromba foi jogar no Universidad de Los Andes, na Venezuela.

Mas se mesmo assim não estiver convencido do quão és vitorioso, lembre-se de Adílio que saiu da Comunidade da Cruzada de São Sebastião, no Rio, entre Ipanema e Leblon e venceu a pobreza e o preconceito racial para chegar onde chegou.

Ah, Sandrão, meu amigo angolano, esse jogo não é apenas seu. É de todos nós, somos um time!

Confidencie com Tita que você, às vezes, fica desconfortável pelo jeito como os rubro-negros te olham. Entretanto, o eterno camisa 7 rubro-negro vai te dizer com propriedade o que é viver isso quando ele encobriu o rosto com a camisa do Vasco e marcou o gol do título do Carioca em 1987. Ele continuou sendo ídolo do clube. E você se transformou em ídolo dele.

Sandrão, quando pensamentos negativos se apresentarem nessa sua 'nova' vida, mate do peito e saia para o jogo como bem fazia Mozer, nosso xerifão.

Mas se as adversidades se tornarem marcadores implacáveis, que você como grande craque que é, drible-as e siga o exemplo de Zico que superou tudo com força, humildade e profissionalismo e foi determinado e obstinado até tornar-se o maior do Flamengo.

Depois disso, meu caro Sandro Rilho, tenho certeza que você vai sair dessa cadeira de rodas e marcar gols importantes como o nosso artilheiro Nunes fez em jogos decisivos.

Desejo o melhor para você e nada mais justo, afinal de contas, Sandrão sempre foi um torcedor apaixonado pelo clube e irrequieto quando o assunto é valorizar ídolos do Flamengo do passado".

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2023

Vai em paz, Patrick!

Por Marcos Vinicius Cabral

"É preciso ser forte e tornar-se resiliente quando o destino nos prega uma peça.

Vítima de um grave acidente automobilístico no fim de janeiro no qual precisou ser internado às pressas no Hospital Estadual Alberto Torres, no Colubandê, em São Gonçalo, o filho mais engraçado de Noêmia, se despediu da vida nesta quinta-feira (16).

Foi embora sem dizer adeus. Partiu em mil pedaços o coração daqueles que tiveram a oportunidade de conhecer aquele rapaz magrinho, careca e com óculos arredondados e gente boa à beça.

A morte estúpida de Patrick, que teve a moto em que pilotava atingida por um carro, deixa um sentimento de revolta e descaso do Poder Público em cada um de nós. 

Patrick leva consigo a alegria que era depositada na vida e que na maioria das vezes essa mesma alegria - imedida e desproporcional - era compartilhada com a mulher, os filhos, familiares e amigos.

Mas o sumiço físico de Patrick deixa em cada um de nós, que teve a oportunidade de conhecê-lo, momentos raros de quem desfrutou de bons momentos ao lado dele.

Tive meu momento alegre com ele. E foi há três anos em Saquarema, na Região dos Lagos, no passeio que fizemos de barco (foto).

Lembro também das vezes em que passava de carro em frente à oficina dele no Rocha e gritava "Fala, Patrick!!!", antes do sinal abrir.

Amigo Patrick, vai com Deus, que na infinita misericórdia, dê forças aos familiares para superar e principalmente conviver com tamanha perda".

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2023

Boechat

 

Por Marcos Vinicius Cabral

Ao abrir a porta, Mel - nossa cadela da raça Shih Tzu - veio me receber diferente dos outros dias.

Era hora do almoço e dessa vez, ela, que estava sozinha em casa, não me sorriu latindo.

Pelo contrário: não sorriu e tampouco latiu. Fiquei preocupado.

Deitada no chão, permaneceu por ali e me observou com olhos profundamente tristes.

Apesar de não ter passado despercebido aquele olhar, me veio à mente que tal tristeza pudesse ser em virtude do forte calor ou em decorrência das tragédias de  Brumadinho em BH, das enchentes no Rio e dos meninos do Flamengo, no CT do clube.

Os cães canalizam alegria e tristeza ao nosso redor e demonstram de várias maneiras.

Mas não eram.

Com o prato do almoço nas mãos, após agradecer a Deus por nunca ter me deixado sem comida no meu lar, liguei a televisão e botei na TV Bandeirantes.

"Eu tenho que dar essa notícia", disse José Luiz Datena, visivelmente abalado, interrompendo  o programa esportivo Os Donos da Bola.

Um acidente envolvendo um caminhão e um  helicóptero, modelo Bell, prefixo PT-HPG, na rodovia Anhanguera, próximo ao quilômetro 7, no viaduto de acesso ao Rodoanel, havia vitimado duas pessoas: o piloto e o passageiro.

Isso deve ter levado uns vinte minutos aproximadamente. 

Sentei e fiquei aproximadamente mais  quarenta, vendo notícias da morte de um dos maiores - se não o maior - jornalista do país: Ricardo Eugênio Boechat.

Voltei para o trabalho com a impressão de ter perdido alguém da família, tamanha sua importância na vida de todo e qualquer cidadão. 

Não o conheci pessoalmente, mas as qualidades profissionais dele dispensam comentários. 

Exímio repórter que apurava com a precisão e passava credibilidade por meio daqueles olhos azulados enormes que nos chamavam atenção.

Apurador sensato que peneirava notícias de suma importância numa época que os meios de comunicação não eram tão eficientes como hoje.

Refiro-me à época das máquinas de escrever nas redações.

Fiel colaborador no começo dos anos 1980 da coluna de Ibrahim Sued - outro notável jornalista - plantava contatos e colhia notícias da alta sociedade carioca, no terreno árido e inóspito. 

Se reinventou e já sendo uma Enciclopédia do Jornalismo, fez coisas inimagináveis, como disponibilizar seu número de celular para os ouvintes do programa Band News FM.

Coisa de gênio e de quem entendia muito da coisa.

Ganhador do Prêmio Esso nos anos 1989, 1992 e 2001 e do Comunique-se em 2006, 2007, 2008, 2010, 2012, 2013, 2014 e 2017), o argentino abrasileirado que amava Niterói, desapareceu segunda-feira, 11 de fevereiro, de nossa ambiência física. 

Vai deixar uma lacuna imprescindível e uma dor latente em que o jornalismo, profissão esta tão maltratada pelo desemprego e desvalorização, vai custar a sarar.

Seu humor e mau humor, renderam-lhe boas histórias como a vez em que ligou ao vivo para a mãe Mercedes no programa de rádio que apresentava desde 2006 e da resposta desaforada para o pastor Silas Malafaia, no entrevero que teve com o mesmo em 2015, sobre intolerância religiosa.

Boechat morreu na segunda-feira dia 11, seu velório e cremação foram ontem dia 12 e hoje resolvi postar esse texto após ver a entrevista da mãe Mercedes nas redes sociais, no qual emocionou a todos nós. 

Boechat era um jornalista que era ouvido por classes de A a Z sem distinção.

Era objetivo e defensor de classes massacradas pelo Poder Público regente no país, como os taxistas por exemplo.

Era instantâneo e imediato, qualidades imprescindíveis para quem trabalha com rádio.

Era, segundo a mamãe, o patinho feio dotado de uma inteligência raríssima. 

Vai fazer falta, ou melhor, já está fazendo.

(Texto escrito, publicado em 2019 nas redes sociais e republicado nesta segunda-feira (13) no meu blog. Essa semana faz quatro anos que Boechat morreu).

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2023

A culpa é da sogra

 

Por Marcos Vinicius Cabral

O Flamengo começou 2023 sendo vice da Supercopa do Brasil para o Palmeiras ao ser derrotado por 4 a 3 e nesta terça-feira (7) viu a carruagem da conquista do bicampeonato Mundial virar abóbora na derrota para o Al-Hilal por 3 a 2.

Mas se o Flamengo iniciou o ano com o pé-esquerdo, o clube começou a pagar um alto preço quando Vitor Pereira, então treinador do Corinthians, deu a seguinte declaração na primeira quinzena de novembro à ESPN:

"Eu me sinto triste, queria muito continuar esse projeto, mas não tem hipótese alguma. Não vou para clube nenhum, não vou pra canto nenhum, eu vou pra casa, tenho que ajudar a estabilizar um pouco o processo da doença da minha sogra que está vivendo na minha casa e por isso tenho que voltar pra lá", alegou Vitor Pereira.

O Flamengo, que nada tinha a ver com isso - pelo menos até aquele momento - era comandado por Dorival Júnior que veio para substituir o fraco Paulo Sousa e conquistou a Copa do Brasil em cima do próprio Corinthians de Vítor Pereira em emocionante decisão no Maracanã e a Taça Libertadores ao bater o Athletico-PR, lá no Estádio Monumental, em Guayaquil, no Equador.

Com o caminho pavimentado com as conquistas - diga-se de passagem, duas senhoras conquistas - natural seria que Dorival Júnior recebesse o convite da diretoria para um coffee break como pretexto para tratar da renovação de contrato.

Mas o que é natural para qualquer um dos 42 milhões de torcedores rubro-negros, não é para a diretoria do clube, que não se sensibilizaria com os feitos de Dorival Júnior.

Sem contar que um dos maiores feito dele no comando da equipe rubro-negra foi recuar Gabigol como arco para armar as jogadas e colocar Pedro enfiado como flecha para marcar os gols.

Resultado: em 31 jogos, a dupla de ataque do Flamengo marcou 32 vezes.

Mas o vice-presidente de futebol, Marcos Braz e Cia. preferiram acreditar no português que usou a doença da sogra para deixar o Timão e deu a ele uma equipe ressentida e extremamente magoada com a demissão de Dorival Júnior.

Apresentado no dia 2 de janeiro, Vitor Pereira prometeu "criar juntos um jogo atrativo, que os jogadores desfrutem e a torcida também", disse VP na primeira coletiva como já técnico do Flamengo.

No Carioquinha, que não serve de parâmetro para absolutamente nada, faz um bom jogo e vence o Nova Iguaçu por 5 a 0, sofreu para superar o Audax Rio e o Bangu por 1 a 0.

Ontem, contra o Al-Hilal, no Mundial de Clubes, foi castigado com dois pênaltis bobos e a expulsão de Gerson.

No intervalo, mexeu mal ao sacar Arrascaeta e tirar Everton Ribeiro no decorrer do jogo.

Agora é juntar os cacos e saber se o treinador que usou a doença da sogra para não permanecer no Corinthians terá, de fato, apoio dessa diretoria, para mexer na forma de jogar e na estrutura do time. Por enquanto, o Flamengo é hoje um time perdido no meio de tantos achados.

Se pudesse voltar no tempo, bem que a história de doença da sogra poderia ter sido verdade e, dessa forma, Vitor Pereira teria ido a Portugal e Dorival Júnior não demitido.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2023

Glória

 


Por Marcos Vinicius Cabral

"Eu queria escrever sobre a Glória Maria, juro para vocês. Mas por incrível que pareça, faltam-me palavras para isso.

Não que eu me sinta incapaz em descrever o sentimento que nós, jornalistas, sentimos com a partida dela neste 2 de fevereiro de 2023, de forma precoce, confesso, apesar dos 73 anos. 

Contudo, transmitir sentimentos por meio de palavras sobre a Glória é tão difícil quanto acordar cedo todos os dias para regar as plantas ou ver o nascimento do sol.

Escrever sobre a representatividade dela na minha vida, me remete ao passado quando estava com meus 12 anos, não sonhava em ser jornalista e chargista e acreditei que a Glória estava envolvida na morte de Tancredo Neves às vésperas do mineiro tomar posse como o primeiro presidente civil após a ditadura militar.

Não existia, à época, o termo fake news, o aplicativo WhatsApp e as redes sociais Instagram, Facebook e Twitter para disseminá-las.

Os disseminadores eram meus pais e os pais de meus amiguinhos que explanavam que "Gloria Maria sabia mais do que devia no episódio", e dessa forma corroboravam com tamanho impropério.

Mas Glória nasceu pobre, era negra, estudou em escola pública e com muita dificuldade se formou pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-Rio) na década de 1960, em jornalismo.

Se eu tenho orgulho dela em um país tão preconceituoso como o nosso, o que dizer você, negro ou negra, com todo respeito, que está lendo isso agora e se alegra com a ascensão da Neguinha, como foi chamada certa vez pelo general João Figueiredo durante a ditadura militar?

Mas a Neguinha não quis apenas quebrar paradigmas neste Brasil pobre de todos nós, quis fazer reportagens e entrar para a história da TV.

Primeira repórter a realizar matérias ao vivo e a cores na televisão no Brasil, desde 1971, quando cobriu a queda do Elevado Paulo de Frontin até a matéria sobre agricultores e ambientalistas que restauram florestas para o Globo Repórter, em 2022, Glória fez cada um de nós perder algum compromisso para assistir alguma matéria produzida por ela. 

Quem não? Eu sim. E várias vezes!

Repórter talentosa que passeou com maestria por todas as editorias na TV Globo, Glória entrevistou Madonna, Mick Jagger, Michael Jackson, Deus e o mundo. Quando foi a vez de entrevistar Freedie Mercury (1946-1991), no terraço do Copacabana Palace, em 1985, o líder do Queen personificou cada um de nós e apertar a bochecha da repórter do Fantástico, no meio da reportagem.

Era nós dizendo: "Neguinha, tu é muito boa no que faz!".

Mas a sorte está sempre do lado dos competentes e com Glória Maria não foi diferente ao esbarrar por acaso com o poeta Carlos Drummond de Andrade, no Rio, e fez uma belíssima entrevista, às véspera do Natal de 1984.

Precisa escrever mais?

Assim como Édson Arantes do Nascimento, o Neguinho que virou Pelé, o rei do futebol, Glória Maria Matta da Silva descansou e continua viva no trabalho jornalístico maravilhoso que deixou.

Nesta sexta-feira (3), o corpo da Neguinha foi cremado em uma cerimônia restrita aos familiares e amigos próximos.

A família de Glória Maria não definiu o local onde serão depositadas as cinzas. 

Entretanto, se forem jogadas para o alto em qualquer lugar do mundo pelas mãos de suas filhas, que cada parte incinerada seja levada pelo vento a quilômetros de distância e pouse tranquilamente sobre pessoas que precisam viver, pelo menos alguns minutos, a Neguinha que fez história com um trabalho a nível de excelência, amou como ninguém pessoas e o trabalho e souber ser, apesar do sucesso, uma criatura querida e humilde.

A maior vitória dela não está em quem ela foi, mas o que deixou para nós!".