quarta-feira, 28 de junho de 2023

Junior


Por Marcos Vinicius Cabral

O amor intrínseco, impoluto e imedido de Mainha e Gildo foi o suficiente para trazer Leovegildo Lins Gama Junior ao mundo naquele 29 de junho de 1954.

Não tivesse nascido homem e corrido descalço atrás de uma bola ainda menino pelas ruas de terra batida em João Pessoa, na Paraíba, Junior quiçá teria sido um grão de areia esfregado entre os dedos por quem acabara de conhecer o mar pela primeira vez e não jogador de futebol.

Quis o destino, que sempre teve nas mãos acontecimentos antes mesmo deles acontecerem, que Junior confessasse com os próprios pés - diferentemente dos mortais que professam com a boca - que nascera para cultivar a imortalidade.


Imortalidade esta adquirida à custa de dedicação, esforço, treinamento, além é claro, do talento que o acompanhou como a própria sombra.

Mas nada disso valeria a pena se não fosse frequentador das praias do Rio de Janeiro, local onde mostrou a habilidade que, modéstia à parte, chamou atenção de um outro modesto, o treinador Bria. 

Levado à Gávea no início dos anos 1970, ser aprovado para fazer parte do elenco rubro-negro seria mero detalhe. Da camisa 4 que vestiu no começo de carreira na lateral-direita do Flamengo, Junior buscou aperfeiçoamento. E conseguiu!

Em busca de afirmação, encarou com naturalidade a chegada de Toninho Baiano para assumir a lateral-direita. Relegado a ser reserva e aceitá-la, disputar a titularidade seria normal para qualquer um. Menos para Junior.

Mas o Capacete - apelido que recebeu graças ao estilo black power da época - buscou soluções. Uma delas foi treinar exaustivamente batendo na bola apenas com a perna esquerda no paredão de madeira que existia na Gávea.

Ambidestro e vestindo o número 5 rubro-negro, Junior se tornou absoluto na lateral-esquerda quando improvisado por Cláudio Coutinho (1939-1981) em 1976, não mais saiu do time. Por ali, defendeu o Flamengo em 874 partidas, enfilerou troféus, se tornou  referência na posição e passou a ser ídolo da exigente torcida rubro-negra.

Mas aquele paraibano merecia muito mais do que ser gigante apenas no Flamengo. Merecia sorte maior na Seleção Brasileira no qual, não encantou o mundo com a camisa 5 - esta pertencia ao eficiente Toninho Cerezo -, mas com a 6 às costas, sambou duas vezes em gramados espanhóis: no gol marcado contra a Argentina, em passe açucarado de Zico na vitória por 3 a 1 e, na derrota para a Itália, que culminou - coincidentemente, vejam vocês - no 5° lugar na classificação final da Copa da Espanha, em 1982.

Sorte a nossa que tivemos Junior no Flamengo e má sorte da Seleção Brasileira, que não teve um jogador como Leovegildo Lins Gama Junior campeão do mundo.

Números, títulos, recordes, prêmios individuais, idolatria, carinho e respeito marcam a trajetória deste que foi - diferentemente de Nilton Santos, a Enciclopédia do Futebol -, um bom livro de autoajuda para quem escolheu ser lateral-esquerdo em um time de futebol.

Parabéns meu amigo Junior, dos quais 11 anos destes 69 que você completa nesta quinta-feira (29), desfruto da amizade de quem é mais do que um ídolo do Flamengo, mas acima de tudo, um ser humano sem igual.

Maestro, parabéns e que Deus lhe abençoe.

domingo, 9 de abril de 2023

A mentira de que "ganhar Fla-Flu é normal"

Por Marcos Vinicius Cabral

Escrevo antes da 13ª decisão entre Flamengo e Fluminense no Campeonato Carioca de 2023. Penso que, neste domingo (09), às 18h (horário de Brasília), a Justiça (se é que ela existe no futebol) prevalecerá no resultado.

Flamengo e Fluminense são os melhores times do Rio de Janeiro. Há um equilíbrio entre eles. O time de Vítor Pereira é mais qualificado, mas os 11 de Fernando Diniz vivem melhor momento. Quando se encontram, tudo pode acontecer. Isso vem se repetindo há quatro anos, quando o Fla ganhou em 2020 e 2021. Ano passado, o Flu evitou o tricampeonato rubro-negro e é, com sobras e merecidamente, o atual campeão Estadual.

Escrevo sem saber se o Mais Querido vai conquistar o 38° título e levá-lo para a Gávea. Ou se o Tricolor das Laranjeiras vai reverter a desvantagem e erguer o 33° troféu da história.

Independentemente das provocações entre torcedores que são, no meu entendimento, necessárias para o futebol. O mundo está chato demais. Imagina se não tiver provocações entre rubro-negros, tricolores, alvinegros e vascaínos?

O encarnar e o tirar sarro, faz parte quando se descortina o espetáculo que é o futebol. O que não condiz são os exageros e  o momento em que alguns torcedores passam do limite.

Mas o pior é a mentira deslavada que alguns deles contam. Especialmente tricolores - não todos, mas alguns em especial - são experts em propagar inverdades. O próprio ditado resume o que Joseph Goebbels, ministro da propaganda na Alemanha nazista, permitiu na reflexão acerca do papel das fakes news na sociedade: "Uma mentira dita mil vezes torna-se verdade". 

Por muito tempo ouvi de torcedores tricolores e engoli a seco que "o Flamengo 'tremia' para o Fluminense". Que "o time de Zico e companhia era freguês!". Ou então que "Assis era carrasco do Flamengo".

O tempo passou, me despi da pessoa comum e ao tornar-me jornalista o clarão de luz veio sobre os fatos.

NÃO HÁ, NUNCA HOUVE E JAMAIS HAVERÁ no Fla-Flu freguesia de qualquer que seja o lado. Vejam bem: refiro-me às finais e não confrontos entre eles.

Em finais, decisão de um contra o outro, estão empatados em 6 a 6. O título de 1919, não entra, pois o futebol não havia entrado na 'Era do Profissionalismo'. Muito menos o triangular de 1983, como alguns colegas insistem em colocar na conta do Fluminense.

O triangular entre Flamengo, Fluminense e Bangu, o time das Laranjeiras sagrou-se campeão e uns pseudônimos 'donos da verdade' propagaram que esse título foi em cima do Flamengo.

Tanto não foi que o Fluminense se garantiu no triangular final do Estadual, ao lado do Flamengo, que era o campeão da Taça Rio, e do Bangu, que somou o maior número de pontos no torneio.

Com isso, na primeira partida, empatando com o Bangu por 1 a 1, o Fluminense levou a suposta decisão para o jogo contra o Flamengo, que mesmo sem Zico, era favorito ao título do Carioca de 1983. Na partida, nos minutos finais, Duílio cobrou falta rápida para Deley, que fez lançamento para Assis - que virou na opinião dos tricolores o carrasco dos rubro-negros - marcar o gol. 

Com esse resultado, o Flamengo foi eliminado. Não perdeu o título. O que restava ao Fluminense era torcer para a vitória do Rubro-Negro contra o Bangu, no dia 14 de dezembro de 1983. E isso aconteceu. O Flamengo venceu o time de Moça Bonita por 2 a 0 e, na tribuna do estádio, o Flu recebeu a taça de campeão.

Para os desavisados e para os propagadores de 'fake news', aqui está a lista dos jogos que são computados como disputa entre Flamengo e Fluminense.

No histórico geral do Fla-Flu, o Flamengo leva vantagem sobre o Fluminense: 161 vitórias do Fla, 141 empates e 140 vitórias do Flu, já contabilizando a partida de ida da decisão do estadual de 2023, vencida pelo Rubro-Negro por 2 a 0.

Quando o assunto é final do Carioca, porém, os números são mais equilibrados. 

Títulos do Flamengo sobre o Fluminense:

1963: Flamengo 0 x 0 Fluminense

1972: Flamengo 2 x 1 Fluminense

1991: Flamengo 5 x 3 Fluminense (1 x 1 e 4 x 2)

2017: Flamengo 3 x 1 Fluminense (1 x 0 e 2 x 1)

2020: Flamengo 3 x 1 Fluminense (2 x 1 e 1 x 0)

2021: Flamengo 4 x 1 Fluminense (1 x 1 e 3 x 1)

Títulos do Fluminense sobre o Flamengo:

1936: Fluminense 7 x 4 Flamengo (2 x 2, 4 x 1 e 1 x 1)

1941: Fluminense 2 x 2 Flamengo

1973: Fluminense 4 x 2 Flamengo

1984: Fluminense 1 x 0 Flamengo

1995: Fluminense 3 x 2 Flamengo

2022: Fluminense 3 x 1 Flamengo (2 x 0 e 1 x 1)

Dito isto, bom jogo. Que vença o melhor!

sexta-feira, 24 de março de 2023

A diferença entre técnico e líder

 


Por Marcos Vinicius Cabral 

"Qualquer modalidade esportiva, independentemente de qual seja, vai muito além do que uma simples disputa por vitórias, troféus ou pódios.

Há uma cartilha do esporte com mandamentos sagrados a ser seguida à risca e que deixam em nós, lições para o resto da vida.

Lágrimas, dores e derrotas fazem parte desta cartilha, que rege em perder e ganhar, resultante do contexto produzido na competição.

Quer a glória? Tem que ter luta! Mas a derrota deixa em nós, por mais que nos machuque, lições inesquecíveis.

A cena que fica para mim como marcante nesta Copa do Mundo do Catar, não foi o pé inchado de Neymar. 

Não foi também os jogadores comendo carne folheada a ouro ou o zagueiro Éder Militão ostentando um relógio avaliado em aproximadamente R$ 3 milhões.

O que fica para mim foi a saída repentina de Tite, após o Brasil ser eliminado para a Croácia, nas cobranças de pênaltis.

Vergonha? Covardia? Egoísmo? 

Para mim, a imagem dos jogadores desolados inundados em lágrimas é tão pertinente quanto a imagem de Tite, técnico deles, saindo apressadamente para o vestiário.

Consideradas às comparações, me lembrou Zidane caminhando para o vestiário, após acertar cabeçada no peito de Materazzi na Copa do Mundo de 2006.

Mas entre mortos e feridos na batalha campestre vencida pelos croatas na sexta-feira (9), no Estádio da Cidade da Educação, o comandante se acovardou e abandonou os soldados depois da batalha perdida.

O que Tite fez foi desumano. Mesmo já tendo anunciado que não continuaria no comando da Seleção Brasileira, poderia demonstrar um pouco mais de carinho e respeito pelos jogadores. Podia não apenas ter olhos para o próprio umbigo. A dor foi alheia e não dele.

Tite, na sua mediocridade como técnico, foi além, e se superou sendo menor ainda como ser humano.

Após estratégia mal traçada em escolhas estranhas nos tiros importantes nas cobranças de pênaltis que saíram pela culatra, não esboçou sentimento pelos jovens soldados, ali feridos, que precisavam de um mão para serem levantados.

Nenhum deles ouviu do comandante: "Vem, levanta! Vamos cuidar dessas feridas que, independente de continuar com vocês, daqui a quatro anos tem uma outra guerra nos Estados Unidos, México e Canadá!".

Poderia eu, na minha insignificância de jornalista e na minha ignorância de ser humano, tentar atenuar o que penso sobre o abandono de campo de Tite, que perdeu uma Copa do Mundo para ele próprio com uma geração talentosa de jogadores à disposição.

Isso é o que Tite foi. Covarde, arrogante e um técnico que se disfarçou de líder. Sem liderança alguma, simplesmente, sucumbiu para uma Croácia que teve, na figura de alguns jogadores, a hombridade de consolar alguns meninos do Brasil.

O futebol é uma arte que imita a vida e aplaude quem cai de pé, perde lutando. 

Entretanto, o futebol e a arte rejeitam covardes e não toleram atitudes como as que Tite teve.

Poderia Tite, ter se espelhado no colega Hajime Moriyasu, técnico do Japão, que chamou seus jogadores para consolá-los depois da derrota para a mesma Croácia na disputa por pênaltis, pelas oitavas de final da Copa do Mundo. 

Na ocasião, atletas foram aplaudidos pela torcida presente no estádio.

No futebol, ainda mais em uma Copa do Mundo, existe uma gigantesca diferença entre ser técnico e líder. 

Técnicos como Tite escalam time, dão instruções, fazem Dança do Pombo e mexem errado.

Líderes deixam lições. 

Essa foi a diferença!".

quarta-feira, 22 de março de 2023

Mulheres são flores

 


Por Marcos Vinicius Cabral 

Mulheres são flores que desabrocham todos os dias quando nos dão um simples sorriso.

Plantadas em uma noite por um casal de jardineiros envoltos na paixão, deixam de ser sementes e acabam se transformando em corpo presente. 

Cheirosas em diversas cores, elas, mulheres, foram extraídas do pecado adâmico de uma simples costela do homem. A melhor parte do corpo é a mulher.

Mas Deus pintou a mulher em uma tela qualquer do mundo e usou tintas da fértil criação.

Brancas, negras, morenas, loiras... cada uma com sintonia e beleza incomparáveis. Ela é a bela visão do que nós, homens, imaginamos.

Elas têm a vastidão do céu e a profundeza do mar. E são misteriosas.

A mulher refresca como a chuva e dá o calor necessário em noites frias com um simples "Eu te amo!". 

Lindas mulheres em sintonias e que são notas musicais de nossos instrumentos. Mulher é emoção. É flor que merece canteiro e carinho.

Precisa ser cuidada. Adubada. E quando se ama uma mulher, ah, ela floresce. E não morre nunca!

Que você, homem, seja um bom jardineiro para essa flor que Deus brotou no jardim da sua vida".

terça-feira, 21 de março de 2023

O salto

 


Por Marcos Vinicius Cabral

"Um imagem vale mais do que mil palavras. Essa que acompanha o texto é uma delas. Não é o fato da cabra saltar de um penhasco para outro simplesmente.

O salto, muito arriscado por sinal, representa muito mais do que um simples pulo. Significa que a consequência deste ato, se for mal pensado, arquitetado e planejado, pode mudar o resto da vida do pobre quadrúpede.

Simplesmente, não é o fato da cabra ter fé o suficiente para realizar decisão tão perigosa. No entanto, o mais importante é notar que a cabra está focada, tem os olhos fixados na direção do objetivo final que é o outro lado. 

Ela não olha para baixo. Não se distrai olhando para cima ou para os lados. Ela não tem medo de cair e morrer.

Não!

Ela não olha para trás e tampouco se lamenta pela decisão que tomou. Não há arrependimento na decisão. O salto para ela tem um só destino: chegar do outro lado! 

Finalmente, muitas vezes na vida, temos coragem para dar um grande salto, seja na vida profissional, pessoal, conjugal, espiritual, ou seja lá na que for. A queda, pode, lógico, acontecer. 

É inevitável!

Nos encontramos, às vezes, olhando para baixo quando estamos por cima e para cima quando estamos caído por algum motivo.

Entretanto, quiçá, decidir dar um pulo arriscado na vida, este é o conselho que dou: se concentre e vá em frente! Tenha métodos para fazê-lo. Aleatoriamente, não se chega a lugar nenhum!

O resultado do salto, decisão única e exclusivamente sua, mostrará se valeu ou não a pena se arriscar".

sexta-feira, 17 de março de 2023

Leandro

 

Texto e ilustração: Marcos Vinicius Cabral 

Por mais que eu tente buscar palavras neste 17 de março de 2023 para dizer o que você representa na minha vida de torcedor rubro-negro, não será suficiente.

Desde o dia em que descobri, aos oito anos de idade, naquele longínquo 1981, um jogador habilidoso, de cabelo escorrido, olhos verdes, pernas arqueadas, que vestia com altivez a camisa 2. Naquela época, ao ver o Anjo das Pernas Tortas Rubro-Negro jogar e, além disso, demonstrar um amor incondicional ao Flamengo, que não fui mais o mesmo.

"Tio, quem é esse jogador?", perguntei com os olhos fixados na TV com imagens desbotada em preto e branco.

"Leandro, um dos mais habilidosos do Flamengo", respondeu meu tio José Cláudio cheio de frio embaixo do edredom na cidade de Venda das Pedras, em Nova Friburgo.

Ali, sem perceber, fui acertado em cheio quando ouvi o seu nome.

Foi paixão à primeira vista quando vi, com os olhos ingênuos da criança que era. E de paixão, sei que você entende.

Mas ali, com meu tio, esqueci Zico. Não quis saber de Junior e nem me preocupava com as jogadas de Adílio e os desarmes na bola do Andrade.

Se o Raul fechava lá atrás e Marinho e Mozer eram intransponíveis, pouco me interessava.

Dava de ombros, se Tita pela direita e Lico pela esquerda, faziam o diabo na defesa adversária.

O que eu queria era saber sobre o Leandro, que já era considerado por mim, um menino de apenas oito anos, meu craque  predileto.

Não te escolhi. Teu futebol me escolheu.

No entanto, você não foi apenas um cracaço ou um herói com super poderes. Mas um herói que eu gostava pelas qualidades que sempre demonstrou em campo. Fora das quatro linhas, conheci o cidadão José Leandro de Souza Ferreira, que me apresentou a própria família e mostrou-me o significado de duas palavras que todo homem deve manter na vida para ser bem-sucedido: simplicidade e humildade.

Você me ensinou muito mais do que é o significado de amar um clube. Eu me via em você, todas as vezes em que seus pés pisavam em um campo de futebol.

Você fez o seu melhor e se doou de corpo e alma. Eu faço isso até hoje na vida.  

Você respeitou o torcedor. Honrou o Manto Sagrado e quisera Deus, encerrou a brilhante carreira cedo demais.

Tudo foi como Deus quis. No entanto, nesta sexta-feira, 17 de março, estou eu aqui te escrevendo mais um texto - sei que sou chato, tolere, mas é coisa de torcedor - para dizer o quanto você foi importante para mim.

Feliz aniversário. Que Deus abençoe sua saúde, sua família e possa te dar o que o coração desejar.

Um forte abraço não só hoje, que é seu aniversário de 64 anos, mas para sempre!

sexta-feira, 3 de março de 2023

Zico

 

Ninguém explica Zico em campo

Por Marcos Vinicius Cabral

"Zico usou cada metro quadrado dos estádios por onde esteve e fez deles um cadafalso de uso pessoal.

A nós, flamenguistas, que vibramos com os gols que fez, que enlouquecemos com as jogadas criadas por uma mente sã e corpo são, medimos com os olhos impávidos os passes milimetricamente dados com extremo zelo para os companheiros de time.

Dentro do quadrado verde denominado campo de futebol, Zico era diferente na maneira que corria, na forma em que batia na bola, no nó que dava nos cadarços das chuteiras e até na entrevista que concedia antes e depois dos jogos.

O filho caçula de dona Matilde e seu Antunes nunca precisou de promoção, a imagem dele fala por si só.

O aniversariante, que chega aos 70 anos nesta sexta-feira (3), permanece com valores imutáveis e inegociáveis. E se tem algo que muda na vida do eterno camisa 10 todo ano que nem ele consegue conter, é o carisma que cresce dia a dia, mês a mês e ano a ano.

Mas Zico é determinação rara. Sempre foi assim. E humilde sempre.

São qualidades que outros ídolos do futebol tanto quanto ele, desconhecem.

No entanto, feliz fomos nós, que agradecemos todos os anos à imponente sede do Flamengo que abriu os braços querendo abraçar aquele menino loirinho, magrinho, ainda pequeno para 14 anos e fez dele um homem, um atleta, um profissional, um ídolo, que acima de tudo é um enorme ser humano.

Mas tão gigante, tão gigante, que os feitos realizados e descortinados aqui, não estão os 508 gols marcados pelo Flamengo, os 30 pela Udinese e nem os 56 pelo Kashima Antlers, como os que merecem aplausos.

Tampouco os títulos que enfileirou com a camisa rubro-negra.

Na figura pública de Zico, é Arthur Antunes Coimbra que presencia os golaços fora de campo.

Longe dos olhos de quem sempre levantou da arquibancada para aplaudir e vibrar com cada jogada ou gol que fez, o Galinho de Quintino continua fazendo golaços por aí.

Zico, eu e o quadro que pintei dele 

Seja no autógrafo dado a uma criança, a um adolescente, na atenção destinada para um idoso que pede para tirar fotos, aos fãs do Flamengo ou de outros times, Zico vai colhendo o reconhecimento plantado lá atrás com muito esforço e dedicação.

As demais qualidades, o futebol se incumbiu.

No entanto, o maior orgulho de todo rubro-negro não é ter Zico como exemplo. Isso é muito, mas muito pouco para quem foi um gigante personificado em quatro letras apenas.

O maior orgulho da Nação Rubro-Negra é saber que tricolores, atleticanos, coritibanos, alvinegros, palmeirenses, são -paulinos, gremistas, vascaínos, corintianos e torcedores de clubes rivais Brasil afora respeitam e amam o Zico tanto quanto nós.

Esse é o nosso orgulho. E orgulhosos, respiramos fundo, estufamos o peito para poder bater nele e dizer: "eu tenho o Zico!".

O futebol aplaude e a vida agradece".

domingo, 26 de fevereiro de 2023

Super Sandro

 

"Neste sábado (25), a emoção tomou conta do Centro de Futebol Zico, no Recreio dos Bandeirantes, com a entrega de uma cadeira de rodas motorizada para Sandro Rilho.

A ação, realizada pela FlaResende e FlaCampos, duas embaixadas espalhadas pelo Brasil vermelho e preto, tem o objetivo de facilitar a locomoção diária do nosso querido Sandrão.

A partir de agora, o semovente rubro-negro que é um notório colaborador para a memória do clube, poderá realizar visitas às sessões de fisioterapia sem gastar tanta energia, desprender o suor imerecido do rosto áspero com a barba por fazer e não mais pensar em desistir como imagino que em muitas vezes tenha encenado o ato.

Não, Sandrão, o jogo não acabou e muito menos é hora de entregar os pontos.

São 90 minutos. Tudo pode acontecer. 

É você contra sua (por enquanto) limitação. É você disputando a bola contra o carrasco do desânimo, do marcador implacável chamado depressão, do zagueiro viril chamado tristeza.

O adversário é forte. O time deles quer anular você, porque sabe que você decide, é craque e é o cara.

O jogo é truncado, estudado, estratégico, marcação em cima e não tem o VAR para elucidar lances duvidosos.

Não esmoreça com o que está ao seu redor.

Não se enfraqueça por palavras negativas de quem não venceu a morte como você venceu.

Não se desfaleça. Muitos planos e projetos Deus tem para a sua vida.

Não permita-se desbotar o brilho que existe em seus olhos e que se torna lindo quando um busto é inaugurado ou  uma outra ação qualquer é realizada pelo FlaNação.

Você não está sozinho nessa. Pergunte ao Raul se foi fácil ser o goleiro que foi na história rubro-negra tendo que aturar os insultos e xingamentos atrás do gol vindos da torcida adversária?

Fala para o Leandro, que jogou no clube que tanto amou por 12 anos convivendo com o Mal do Cawboy nas pernas, que você pensou em desistir do jogo.

Explique para o Marinho - que faz 68 anos na segunda-feira (27) - e o Lico, que saíram de Londrina e Joinville apostando apenas no talento deles para vencer no Flamengo, que você não creu que venceria a batalha  ao derrotar o Covid-19.

Desabafe com Junior e Andrade que você ficou longe de muitas pessoas que te amam enquanto esteve em coma, no entanto, não esqueça que o Maestro ficou longe cinco anos no futebol italiano e o Tromba foi jogar no Universidad de Los Andes, na Venezuela.

Mas se mesmo assim não estiver convencido do quão és vitorioso, lembre-se de Adílio que saiu da Comunidade da Cruzada de São Sebastião, no Rio, entre Ipanema e Leblon e venceu a pobreza e o preconceito racial para chegar onde chegou.

Ah, Sandrão, meu amigo angolano, esse jogo não é apenas seu. É de todos nós, somos um time!

Confidencie com Tita que você, às vezes, fica desconfortável pelo jeito como os rubro-negros te olham. Entretanto, o eterno camisa 7 rubro-negro vai te dizer com propriedade o que é viver isso quando ele encobriu o rosto com a camisa do Vasco e marcou o gol do título do Carioca em 1987. Ele continuou sendo ídolo do clube. E você se transformou em ídolo dele.

Sandrão, quando pensamentos negativos se apresentarem nessa sua 'nova' vida, mate do peito e saia para o jogo como bem fazia Mozer, nosso xerifão.

Mas se as adversidades se tornarem marcadores implacáveis, que você como grande craque que é, drible-as e siga o exemplo de Zico que superou tudo com força, humildade e profissionalismo e foi determinado e obstinado até tornar-se o maior do Flamengo.

Depois disso, meu caro Sandro Rilho, tenho certeza que você vai sair dessa cadeira de rodas e marcar gols importantes como o nosso artilheiro Nunes fez em jogos decisivos.

Desejo o melhor para você e nada mais justo, afinal de contas, Sandrão sempre foi um torcedor apaixonado pelo clube e irrequieto quando o assunto é valorizar ídolos do Flamengo do passado".

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2023

Vai em paz, Patrick!

Por Marcos Vinicius Cabral

"É preciso ser forte e tornar-se resiliente quando o destino nos prega uma peça.

Vítima de um grave acidente automobilístico no fim de janeiro no qual precisou ser internado às pressas no Hospital Estadual Alberto Torres, no Colubandê, em São Gonçalo, o filho mais engraçado de Noêmia, se despediu da vida nesta quinta-feira (16).

Foi embora sem dizer adeus. Partiu em mil pedaços o coração daqueles que tiveram a oportunidade de conhecer aquele rapaz magrinho, careca e com óculos arredondados e gente boa à beça.

A morte estúpida de Patrick, que teve a moto em que pilotava atingida por um carro, deixa um sentimento de revolta e descaso do Poder Público em cada um de nós. 

Patrick leva consigo a alegria que era depositada na vida e que na maioria das vezes essa mesma alegria - imedida e desproporcional - era compartilhada com a mulher, os filhos, familiares e amigos.

Mas o sumiço físico de Patrick deixa em cada um de nós, que teve a oportunidade de conhecê-lo, momentos raros de quem desfrutou de bons momentos ao lado dele.

Tive meu momento alegre com ele. E foi há três anos em Saquarema, na Região dos Lagos, no passeio que fizemos de barco (foto).

Lembro também das vezes em que passava de carro em frente à oficina dele no Rocha e gritava "Fala, Patrick!!!", antes do sinal abrir.

Amigo Patrick, vai com Deus, que na infinita misericórdia, dê forças aos familiares para superar e principalmente conviver com tamanha perda".

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2023

Boechat

 

Por Marcos Vinicius Cabral

Ao abrir a porta, Mel - nossa cadela da raça Shih Tzu - veio me receber diferente dos outros dias.

Era hora do almoço e dessa vez, ela, que estava sozinha em casa, não me sorriu latindo.

Pelo contrário: não sorriu e tampouco latiu. Fiquei preocupado.

Deitada no chão, permaneceu por ali e me observou com olhos profundamente tristes.

Apesar de não ter passado despercebido aquele olhar, me veio à mente que tal tristeza pudesse ser em virtude do forte calor ou em decorrência das tragédias de  Brumadinho em BH, das enchentes no Rio e dos meninos do Flamengo, no CT do clube.

Os cães canalizam alegria e tristeza ao nosso redor e demonstram de várias maneiras.

Mas não eram.

Com o prato do almoço nas mãos, após agradecer a Deus por nunca ter me deixado sem comida no meu lar, liguei a televisão e botei na TV Bandeirantes.

"Eu tenho que dar essa notícia", disse José Luiz Datena, visivelmente abalado, interrompendo  o programa esportivo Os Donos da Bola.

Um acidente envolvendo um caminhão e um  helicóptero, modelo Bell, prefixo PT-HPG, na rodovia Anhanguera, próximo ao quilômetro 7, no viaduto de acesso ao Rodoanel, havia vitimado duas pessoas: o piloto e o passageiro.

Isso deve ter levado uns vinte minutos aproximadamente. 

Sentei e fiquei aproximadamente mais  quarenta, vendo notícias da morte de um dos maiores - se não o maior - jornalista do país: Ricardo Eugênio Boechat.

Voltei para o trabalho com a impressão de ter perdido alguém da família, tamanha sua importância na vida de todo e qualquer cidadão. 

Não o conheci pessoalmente, mas as qualidades profissionais dele dispensam comentários. 

Exímio repórter que apurava com a precisão e passava credibilidade por meio daqueles olhos azulados enormes que nos chamavam atenção.

Apurador sensato que peneirava notícias de suma importância numa época que os meios de comunicação não eram tão eficientes como hoje.

Refiro-me à época das máquinas de escrever nas redações.

Fiel colaborador no começo dos anos 1980 da coluna de Ibrahim Sued - outro notável jornalista - plantava contatos e colhia notícias da alta sociedade carioca, no terreno árido e inóspito. 

Se reinventou e já sendo uma Enciclopédia do Jornalismo, fez coisas inimagináveis, como disponibilizar seu número de celular para os ouvintes do programa Band News FM.

Coisa de gênio e de quem entendia muito da coisa.

Ganhador do Prêmio Esso nos anos 1989, 1992 e 2001 e do Comunique-se em 2006, 2007, 2008, 2010, 2012, 2013, 2014 e 2017), o argentino abrasileirado que amava Niterói, desapareceu segunda-feira, 11 de fevereiro, de nossa ambiência física. 

Vai deixar uma lacuna imprescindível e uma dor latente em que o jornalismo, profissão esta tão maltratada pelo desemprego e desvalorização, vai custar a sarar.

Seu humor e mau humor, renderam-lhe boas histórias como a vez em que ligou ao vivo para a mãe Mercedes no programa de rádio que apresentava desde 2006 e da resposta desaforada para o pastor Silas Malafaia, no entrevero que teve com o mesmo em 2015, sobre intolerância religiosa.

Boechat morreu na segunda-feira dia 11, seu velório e cremação foram ontem dia 12 e hoje resolvi postar esse texto após ver a entrevista da mãe Mercedes nas redes sociais, no qual emocionou a todos nós. 

Boechat era um jornalista que era ouvido por classes de A a Z sem distinção.

Era objetivo e defensor de classes massacradas pelo Poder Público regente no país, como os taxistas por exemplo.

Era instantâneo e imediato, qualidades imprescindíveis para quem trabalha com rádio.

Era, segundo a mamãe, o patinho feio dotado de uma inteligência raríssima. 

Vai fazer falta, ou melhor, já está fazendo.

(Texto escrito, publicado em 2019 nas redes sociais e republicado nesta segunda-feira (13) no meu blog. Essa semana faz quatro anos que Boechat morreu).

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2023

A culpa é da sogra

 

Por Marcos Vinicius Cabral

O Flamengo começou 2023 sendo vice da Supercopa do Brasil para o Palmeiras ao ser derrotado por 4 a 3 e nesta terça-feira (7) viu a carruagem da conquista do bicampeonato Mundial virar abóbora na derrota para o Al-Hilal por 3 a 2.

Mas se o Flamengo iniciou o ano com o pé-esquerdo, o clube começou a pagar um alto preço quando Vitor Pereira, então treinador do Corinthians, deu a seguinte declaração na primeira quinzena de novembro à ESPN:

"Eu me sinto triste, queria muito continuar esse projeto, mas não tem hipótese alguma. Não vou para clube nenhum, não vou pra canto nenhum, eu vou pra casa, tenho que ajudar a estabilizar um pouco o processo da doença da minha sogra que está vivendo na minha casa e por isso tenho que voltar pra lá", alegou Vitor Pereira.

O Flamengo, que nada tinha a ver com isso - pelo menos até aquele momento - era comandado por Dorival Júnior que veio para substituir o fraco Paulo Sousa e conquistou a Copa do Brasil em cima do próprio Corinthians de Vítor Pereira em emocionante decisão no Maracanã e a Taça Libertadores ao bater o Athletico-PR, lá no Estádio Monumental, em Guayaquil, no Equador.

Com o caminho pavimentado com as conquistas - diga-se de passagem, duas senhoras conquistas - natural seria que Dorival Júnior recebesse o convite da diretoria para um coffee break como pretexto para tratar da renovação de contrato.

Mas o que é natural para qualquer um dos 42 milhões de torcedores rubro-negros, não é para a diretoria do clube, que não se sensibilizaria com os feitos de Dorival Júnior.

Sem contar que um dos maiores feito dele no comando da equipe rubro-negra foi recuar Gabigol como arco para armar as jogadas e colocar Pedro enfiado como flecha para marcar os gols.

Resultado: em 31 jogos, a dupla de ataque do Flamengo marcou 32 vezes.

Mas o vice-presidente de futebol, Marcos Braz e Cia. preferiram acreditar no português que usou a doença da sogra para deixar o Timão e deu a ele uma equipe ressentida e extremamente magoada com a demissão de Dorival Júnior.

Apresentado no dia 2 de janeiro, Vitor Pereira prometeu "criar juntos um jogo atrativo, que os jogadores desfrutem e a torcida também", disse VP na primeira coletiva como já técnico do Flamengo.

No Carioquinha, que não serve de parâmetro para absolutamente nada, faz um bom jogo e vence o Nova Iguaçu por 5 a 0, sofreu para superar o Audax Rio e o Bangu por 1 a 0.

Ontem, contra o Al-Hilal, no Mundial de Clubes, foi castigado com dois pênaltis bobos e a expulsão de Gerson.

No intervalo, mexeu mal ao sacar Arrascaeta e tirar Everton Ribeiro no decorrer do jogo.

Agora é juntar os cacos e saber se o treinador que usou a doença da sogra para não permanecer no Corinthians terá, de fato, apoio dessa diretoria, para mexer na forma de jogar e na estrutura do time. Por enquanto, o Flamengo é hoje um time perdido no meio de tantos achados.

Se pudesse voltar no tempo, bem que a história de doença da sogra poderia ter sido verdade e, dessa forma, Vitor Pereira teria ido a Portugal e Dorival Júnior não demitido.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2023

Glória

 


Por Marcos Vinicius Cabral

"Eu queria escrever sobre a Glória Maria, juro para vocês. Mas por incrível que pareça, faltam-me palavras para isso.

Não que eu me sinta incapaz em descrever o sentimento que nós, jornalistas, sentimos com a partida dela neste 2 de fevereiro de 2023, de forma precoce, confesso, apesar dos 73 anos. 

Contudo, transmitir sentimentos por meio de palavras sobre a Glória é tão difícil quanto acordar cedo todos os dias para regar as plantas ou ver o nascimento do sol.

Escrever sobre a representatividade dela na minha vida, me remete ao passado quando estava com meus 12 anos, não sonhava em ser jornalista e chargista e acreditei que a Glória estava envolvida na morte de Tancredo Neves às vésperas do mineiro tomar posse como o primeiro presidente civil após a ditadura militar.

Não existia, à época, o termo fake news, o aplicativo WhatsApp e as redes sociais Instagram, Facebook e Twitter para disseminá-las.

Os disseminadores eram meus pais e os pais de meus amiguinhos que explanavam que "Gloria Maria sabia mais do que devia no episódio", e dessa forma corroboravam com tamanho impropério.

Mas Glória nasceu pobre, era negra, estudou em escola pública e com muita dificuldade se formou pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-Rio) na década de 1960, em jornalismo.

Se eu tenho orgulho dela em um país tão preconceituoso como o nosso, o que dizer você, negro ou negra, com todo respeito, que está lendo isso agora e se alegra com a ascensão da Neguinha, como foi chamada certa vez pelo general João Figueiredo durante a ditadura militar?

Mas a Neguinha não quis apenas quebrar paradigmas neste Brasil pobre de todos nós, quis fazer reportagens e entrar para a história da TV.

Primeira repórter a realizar matérias ao vivo e a cores na televisão no Brasil, desde 1971, quando cobriu a queda do Elevado Paulo de Frontin até a matéria sobre agricultores e ambientalistas que restauram florestas para o Globo Repórter, em 2022, Glória fez cada um de nós perder algum compromisso para assistir alguma matéria produzida por ela. 

Quem não? Eu sim. E várias vezes!

Repórter talentosa que passeou com maestria por todas as editorias na TV Globo, Glória entrevistou Madonna, Mick Jagger, Michael Jackson, Deus e o mundo. Quando foi a vez de entrevistar Freedie Mercury (1946-1991), no terraço do Copacabana Palace, em 1985, o líder do Queen personificou cada um de nós e apertar a bochecha da repórter do Fantástico, no meio da reportagem.

Era nós dizendo: "Neguinha, tu é muito boa no que faz!".

Mas a sorte está sempre do lado dos competentes e com Glória Maria não foi diferente ao esbarrar por acaso com o poeta Carlos Drummond de Andrade, no Rio, e fez uma belíssima entrevista, às véspera do Natal de 1984.

Precisa escrever mais?

Assim como Édson Arantes do Nascimento, o Neguinho que virou Pelé, o rei do futebol, Glória Maria Matta da Silva descansou e continua viva no trabalho jornalístico maravilhoso que deixou.

Nesta sexta-feira (3), o corpo da Neguinha foi cremado em uma cerimônia restrita aos familiares e amigos próximos.

A família de Glória Maria não definiu o local onde serão depositadas as cinzas. 

Entretanto, se forem jogadas para o alto em qualquer lugar do mundo pelas mãos de suas filhas, que cada parte incinerada seja levada pelo vento a quilômetros de distância e pouse tranquilamente sobre pessoas que precisam viver, pelo menos alguns minutos, a Neguinha que fez história com um trabalho a nível de excelência, amou como ninguém pessoas e o trabalho e souber ser, apesar do sucesso, uma criatura querida e humilde.

A maior vitória dela não está em quem ela foi, mas o que deixou para nós!".

domingo, 29 de janeiro de 2023

Solidão e tempo

 

Por Marcos Vinicius Cabral

"Os dias estão passando rápido demais.

Em um estalar de dedos é janeiro, no piscar de olhos dezembro e com os cabelos brancos à mostra se chega à conclusão que estamos envelhecendo mais rápido do que queríamos e não lentamente como é desejado.

Não está dando para aproveitar as coisas como antes e momentos especiais ao lado de quem amamos acabam sendo substituídos por trabalho. Muito trabalho.

Se o tempo é ruim, há algo ainda pior: a solidão!

Mas existem os que estão só. E é por eles que escrevo.

Escrevo porque imagino que conviver com a casa vazia, a televisão desligada, um copo apenas de café sob a mesa e sem ninguém para conversar deva ser duro. E o pior: tudo em silêncio!

Nenhuma mão para abrir a porta e ninguém à espera do outro chegar. 

A pessoa está só. A solidão é a única companheira.

A tristeza pede para entrar na história. Quando menos se espera visitas, a tristeza bate à porta e quer entrar sem ser convidada.

No entanto, deixa que eu lhe diga: sua tristeza não vem da solidão.  

Vem da mente fértil e dela surgem fantasias. Isso é um perigo.

Como você se comporta com a solidão? 

Aprenda: as coisas agem e acontecem quando recebem nomes que lhe damos. 

Se chamo minha solidão de inimiga, ela será minha inimiga. E do contrário, a mesma coisa.

Existem pessoas que convivem com a solidão numa boa. Alguns têm vários amigos, estão rodeados de familiares e mesmo assim continuam sentindo-se só.

Por incrível que pareça, não é a quantidade de pessoas que determina o fim da solidão, mas a qualidade da companhia.

Melhor uma pessoa especial ao seu lado e em silêncio do que 15 outras falando determinados assuntos.

Certa vez, Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) disse: "Por muito tempo achei que a ausência é a falta. E lastimava, ignorante, a falta. Hoje não a lastimo. Não há falta na ausência. A ausência é um estar em mim... essa ausência assimilada, ninguém a rouba mais de mim".

Saiba conviver com a solidão e com o tempo. No fim da vida serão, mais cedo ou mais tarde, as melhores companhias".

Roberto

 


Por Marcos Vinicius Cabral

Roberto foi o menino de olhar frágil e que sorria pouco tamanha seriedade em que encarava o sonho em ser jogador de futebol.

Criado no bairro de São Bento, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, Roberto era Calu e viveu momentos difíceis quando um grave tumor na perna quase interrompeu o sonho de vestir a camisa 10 do Vasco da Gama, seu clube de coração. 

Mas Deus e a mãe Neusa, que passou os momentos difíceis ao lado do filho, souberam cuidar muito bem da cabeça e coração do menino.

O tempo passou e as feridas do passado ficaram para trás.

Já crescido, o menino triste deu lugar a um habilidoso e notável jogador do São Bento, clube tradicional de Duque de Caxias, onde José Maia, o pai, havia sido goleiro. Já a mãe Neusa, ferrenha torcedora do Parque Lafayette, seu arquirrival.

Terceiro e último filho a nascer, Roberto ia dentro das quatro linhas fazendo gols e inspirado por Jairzinho, Furacão da Copa de 1970, aos poucos mostrava que bola na rede era o ele sabia fazer melhor.

Se o destino havia lhe tirado o sorriso quando ficou de cama por alguns meses, dessa vez o destino lhe compensou e colocou Francisco de Souza Ferreira, conhecido por Gradim, olheiro do Vasco da Gama no seu caminho e que se encantou com o moleque. Era 1969. 

Calu era coisa do passado e em São Januário, já aprovado na peneira, passou a ser chamado apenas por Roberto.

No primeiro ano de juvenil marcou 46 gols, encorpou em massa muscular e ganhou 15 quilos. 

Contra o Bahia, lançado por Admildo Chirol, no Campeonato Brasileiro de 1971, passou em branco.

Titular pela primeira vez, passou em branco também na derrota por 2 a 1 contra o Atlético-MG e não correspondeu às expectativas criadas em torno do futebol dele. Com isso, acabou substituído. 

Mas o destinou tratou de entrar em ação mais uma vez e aquele começo difícil seria esquecido definitivamente.

Todavia, se já falecido sueco Alfred Nobel por algum milagre, pudesse voltar à vida e, na sua qualidade de químico e inventor da dinamite, fosse indicado para receber o prêmio que leva o seu nome, ficaria, na certa, profundamente lisonjeado.

Motivos não lhe faltariam para colher os resultados de sua invenção, já que ela atravessou séculos, irrompeu mares, explodiu como bolas de fogo nos céus existentes do universo e foi, anos mais tarde, visto como grande feito naquele 25 de novembro de 1971, no “garoto dinamite” contra o Internacional, em pleno Maracanã.

Surgia enfim, um artefato à base de nitroglicerina dos pés daquele jovem de apenas 17 anos, que destruía defesas e fazia com que seus marcadores entrassem em conflito numa guerra declarada por cada gol explodido, como o seu primeiro na carreira contra a equipe Colorada.

A palavra dinamite nunca havia sido tão bem aplicada para descrever a ação de um ser humano de carne e osso, que aplicava força nos chutes.

Graças aos repórteres Aparício Pires e Eliomário Valente do Jornal dos Sports - que cobriam os treinos dos juvenis do Vasco na época - que o Roberto tornou-se Dinamite.

Enquanto vestiu a camisa do Club de Regatas Vasco da Gama - foi sem demérito algum para os outros ídolos de São Januário - o maior explosivo utilizado pelo clube. Assim era Roberto.

Não, não um Roberto qualquer. Era Roberto Dinamite! Esse mesmo Roberto que devemos incluir o Dinamite e torná-lo um nome composto.

Esse sobrenatural centroavante que conquistou as Bolas de Prata da revista Placar, em 1979, 1981 e 1984.

Esse desbravador de marcadores que foi artilheiro dos campeonatos brasileiros de 1974 e de 1984, ambos com 16 gols. 

Esse extraordinário atacante que foi artilheiro do Campeonato Carioca de 1978 com 19 gols, de 1981 com 31 gols e de 1985 com 12 gols.

Esse destruidor de esquemas táticos que foi artilheiro da Copa América de 1983 com 3 gols. Esse jogador diferenciado que foi artilheiro do Vasco em todas as temporadas de 1973 até 1985.


Esse exuberante profissional que continua sendo o maior artilheiro da história do Campeonato Brasileiro nos 328 jogos disputados e nas 190 explosões de gols. Esse camisa 10 vascaíno que é o maior artilheiro da história do Campeonato Carioca com 284 gols.

Esse atleta que é o maior artilheiro da história do Vasco da Gama com 708 gols. 

Esse jogador de talento esporádico que é considerado o maior artilheiro da história do estádio de São Januário com 184 gols.

Esse gênio da bola que é o atleta que mais vestiu a camisa do Vasco da Gama em sua rica história com 1.110 jogos. 

Esse artilheiro dos artilheiros que é, ao lado de Pelé e Rogério Ceni, os três jogadores brasileiros com mais de mil jogos por um único clube.

Esse exímio cobrador de faltas que foi eleito para o time dos sonhos do Vasco da Gama pela revista Placar em 2006.

Enfim, o camisa 10 de São Januário era um explosivo diferente, que não causava dano material algum, mas fazia vítimas por onde passava. Para o clube da Cruz de Malta, essa explosão suscitava em seus torcedores uma enorme alegria e a certeza que com ele em campo, gols eram questões de minutos.

Mas o gênio Roberto Dinamite era assim... ele explodia gols! 

De todos os jeitos, de diversas formas e de diferentes tipos. Muitos, centenas, milhares… e por mais de duas décadas, ecoou em estádios de vários cantos do Brasil e até do mundo, o barulho retumbante de gols, muitos gols.

De tanto ter seus gols amplificados pelos estádios de futebol mundo afora acabou chegando à Espanha e aos ouvidos do técnico espanhol Joaquim Rifé que pediu sua contratação.

Com 26 anos, nove temporadas no cruzmaltino e sendo assediado por clubes europeus, o Vasco não pôde evitar a transferência de seu melhor atleta para o Barcelona, que desembolsou 56 milhões de pesetas - moeda utilizada na Espanha entre 1869 a 2002 - e o tirou do Rio de Janeiro.

“Eu voltarei”, diria na ida. Na estreia no clube catalão, marcou logo dois gols e alçou voos maiores. Entretanto, o técnico que havia pedido sua contratação foi demitido três rodadas depois, sendo substituído pelo argentino Helenio Herrera, que cortou suas asas ao não utilizá-lo.

Nos três meses em que esteve vestindo as cores do Barça, o desejo de voltar a jogar era grande. Com o pensamento em voltar ao Brasil, recebeu Márcio Braga - então presidente do Flamengo - e Eurico Miranda - a mando do presidente Alberto Pires - que queriam a qualquer custo trazê-lo de volta ao Rio de Janeiro.

Nessa queda de braço, a paixão falou mais alto: Roberto Dinamite estava de volta a São Januário.

Em 5 de maio de 1980, a reestreia era contra o Corinthians, no Maracanã. O resultado foi uma goleada acachapante de 5 a 2, no qual o camisa 10 fez todos os gols da equipe vascaína.

Foi a volta triunfal do maior ídolo do clube, acompanhada inclusive por um repórter de Barcelona, que relataria o jogo para um jornal local com os dizeres: “Esto, sí, es lo verdadeiro Dinamita”, (os espanhóis nunca souberam pronunciar Di-na-mi-te)!

Mas ele havia voltado!

Carlos Roberto de Oliveira foi Dinamite em estado puro na magia de um futebol aprazível. Titular na Copa do Mundo de 1978, na Argentina, faltou pouco para ser campeão com a camisa 20 amarelinha.

Atravessou a década de 80 sendo mortal como sempre, foi injustiçado na Copa da Espanha em 1982, jogou na Associação Portuguesa de Desportos e disputou grandes jogos contra o Flamengo.

Ainda deu tempo de jogar no Campo Grande Atlético Clube em 1993, um pouco antes de se aposentar. Enveredou na política em 1992, elegendo-se vereador da cidade do Rio de Janeiro pelo PSDB e dois anos depois, elegeu-se deputado estadual, cargo este onde se reelegeria em 1998, 2002, 2006 e 2010.

Foi presidente do clube que tanto amou, mas não teve o sucesso dos gramados.

Na manhã deste domingo (8), Roberto saiu de cena derrotado por um maldito câncer. Lutou bravamente contra a doença e deixa vários exemplos para cada um de nós.

Humildade, simplicidade e caráter são alguns deles.

Minha eterna gratidão ao Bob, como era chamado carinhosamente pelos amigos, pelas duas vezes que me recebeu: uma em São Januário, em 2008, quando dei uma caricatura de presente e levei meu pai para conhecê-lo e outra em sua própria residência quando o entrevistamos para o TCC da faculdade em 2017.

Roberto Dinamite foi gigante. E me perdoem Romário, Edmundo, Bismarck, William, Bebeto, Geovani, Sorato, Mauricinho, Felipe e Juninho. E todos que já passaram pelo Vasco: vocês foram rasos (com todo respeito às suas histórias) diante da profundidade que o eterno camisa 10 do Vasco representa não apenas para o clube de São Januário, mas para o futebol brasileiro.

Viva Dinamite e muitas explosões de coisas boas para você aí no céu!

Matéria do velório de Roberto Dinamite


Indescritível a despedida de Roberto Dinamite em São Januário. Só quem viveu esse momento histórico sabe o que estou falando. Deus, meu muito obrigado por me proporcionar isso. O link da matéria está abaixo:

https://www.atribunarj.com.br/amigos-fas-e-familiares-dao-adeus-a-roberto-dinamite/

Um ano sem meu pai

 

Por Marcos Vinicius Cabral

"Há um ano que não escuto o portão da garagem se abrir e não vejo mais meu pai chegando tarde da noite trajando aquela camisa vermelha da cooperativa, vestindo calça preta e guardando o carro na garagem depois de mais um dia de trabalho.

O carro, estacionado há um ano no mesmo lugar, parece que continua aqui esperando por ele. Às vezes, meus rompantes saudosistas me fazem acreditar que ele vai chegar!

Há um ano que ele não chega. E quando volto à realidade, sei que não vai mais chegar. Nunca mais!

Mas essa quarta-feira, dia 18 de janeiro, se torna um dia doloroso e inesquecível. Foi neste dia, que meu pai deu entrada no Pronto Socorro Central, no Zé Garoto, com fortes dores no peito e não mais voltou.

Foi neste dia que uma sucessão de erros cometidos pelos funcionários do PSC, nos tirou a possibilidade de cuidar da saúde do meu pai.

Mas hoje é dia também, acredite você que está lendo tamanha verborragia, de lembrar de coisas boas.

Lembrar, por exemplo, quando era taxista, em 2008, recém-saído do jornal O São Gonçalo, na primeira vez que peguei uma corrida para a Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio, me perdi na volta e ele, desesperado, me mandava recados pelo rádio PX da Central de Táxi e como não respondia e com o celular desligado, foi atrás de mim.

Coisas de pai. De quem protege. 

É lógico que essa história teve final feliz, mas a bronca nunca mais esqueci: "Sua filha tem um ano, mas quando ela crescer, você vai entender o significado da palavra pai e o porquê fiz isso", foi o que me disse no dia seguinte enquanto conversávamos no ponto de táxi.

Meu pai era assim. Pedra bruta e valiosa. Grosso comigo, mas no fundo me amava à maneira dele.

Entretanto, ainda resiste ao tempo alguns ensinamentos dele, tais como: respeitar os mais velhos, falar sempre a verdade, ser honesto, pontual e fazer o melhor em tudo que eu fosse fazer na vida.

Portanto, hoje, um ano da morte dele, esses ensinamentos compõem o que chamo de "um senhor legado" que faço questão de expressar para que todos saibam que foi o que de mais valioso ele, meu pai, meu amigo e herói, deixou.

Mas meu pai fora querido por muitos e inimigo de poucos, Alicate, como era conhecido no meio dos taxistas, era um sacana de marca maior.

Meu pai era tão parceiro de quem ele gostava que se dava ao luxo de cozinhar e convidar colegas taxistas para almoçarem com ele no sábado ou em um dia qualquer da semana.

"Alicate, você está de parabéns. Que comida gostosa. Não sabia que você cozinhava tão bem assim", era o que ele mais ouvia.

E sei que aquelas palavras, alegravam o coração dele. Ele gostava de elogios. Fazia tudo em excelência para recebê-los. E recebia. Muitos, por sinal.

Mal sabiam eles, que teve uma época que ele era taxista em Niterói e muitas das vezes, acordava às 4 horas para cozinhar e levava quentinhas em isopor para vender para o pessoal na fila de táxi, comerciantes e lojista na Rua da Conceição, no Centro.

Meu pai sempre foi guerreiro. Sempre fez do limão, uma limonada.

Se como taxista e empreendedor foi um sucesso, nos campos de futebol foi um fracasso.

Quando brigava para ser o dono da camisa 1 da extinta Fábrica Fluminense de Tecidos, no Barreto, em Niterói, era um goleiro metido a besta.

Certa vez, no comecinho dos anos 1980, em uma excursão contra um combinado de jogadores amadores de Nova Friburgo - nossa terra Natal - que serviu de preparação para o Campeonato do Sesi, Valdecir, goleiro titular, se machucou e nos minutos finais entrou meu pai no lugar dele.

Na primeira falta a favor do adversário, no meio de campo, corajoso e confiante nas suas qualidades embaixo dos paus, não quis barreira.

O cobrador mandou um 'pombo sem asa' à lá Roberto Carlos que passou igual a um foguete por debaixo das pernas dele.

Que frango! Resultado: 1 a 0 para os donos da casa e o pessoal do time quase bateu nele e eu, com oito anos, senti vergonha em dizer que o meu pai era o goleiro.

Coisas de criança, vai entender.

Mas meu saudoso pai era uma figura e tinha um senso de humor que alegrava qualquer um.

Até Junior, craque do Flamengo e Seleção Brasileira, se amarrou nele, quando estivemos comemorando o aniversário do irmão do Maestro em Copacabana.

Na ocasião, festa restrita a convidados escolhidos a dedo, meu pai colou com um dos irmãos do atual comentarista esportivo da TV Globo e ficou bêbado de tanto uísque.

Na volta para casa, dirigi e ele veio dormindo de Copacabana até São Gonçalo.

Mas meu pai soube viver. Até hoje sinto saudades das broncas que me dava. Sinto saudades do cheiro, da voz e do sorriso dele.

Também sinto saudades das broncas nas netas e do ciúme exacerbado que tinha das ferramentas que até hoje permanecem guardadas no armário construído por ele.

Entretanto, gostava de implicar e tirava sarro com ele. Quando estava de bigode, falava para ele que gostava de vê-lo de barba. De barba, dizia que preferia o bigode ou cavanhaque. E assim foi, até ele ficar com o rosto nu, sem barba e bigode por um bom tempo.

Meu pai era assim. Não havia nele super poderes. 

Não era ágil como o Homem-Aranha, mas escalava paredes pelos filhos.  

Não era Superman, mas sempre foi para nós, um pai de aço. 

Não era o Batman, mas foi um notívago para levar o sustento para casa em épocas de vacas magras.

Ah, meu pai. Queria que estivesse aqui. Sei que ficaria feliz e guardaria todas as matérias que fiz no A Tribuna, principalmente as do Pelé e Roberto Dinamite, o seu ídolo.

Meu pai, sei que não fui um filho tão amado como foram minhas irmãs. Eu sei disso. Mas quero que saibas, que te amei até o último dia de vida".

Dezesseis vezes Gabi

 



Por Marcos Vinicius Cabral

Foi de grão em grão para que a areia presente na ampulheta que determina o tempo, transformasse acontecimentos simples em especiais. 

Até hoje eles são lembrados por mim. Cada um deles é importante e merece ser guardado na prateleira de coisas boas.

Gabrielle chegou na nossa vida em um momento especial. 

Me fez sorrir e chorar ao mesmo tempo na primeira vez em que olhei para ela através do vidro na sala ao lado da de parto quando era pesada por uma enfermeira no Hospital Santa Marta em Santa Rosa, Niterói.

Mas Deus me proporcionou no seu tempo, experimentar a sensação indescritível do que é ser pai de uma menina linda e que completa nesta segunda-feira (16) mais um ano de vida.

Lamento apenas ter sido pai aos 33 anos, mas que miserável sou para questionar o Criador do universo após me presentear com a Gabrielle?

Penso e repenso todos os dias sobre a filha que estou deixando para o mundo. Acho inclusive que é a minha melhor contribuição, já que a Gabi ou Bi - como costumo chamá-la - é uma menina que se preocupa com o próximo, é atenciosa com todos, respeita os mais velhos, é ouvinte de bons conselhos e acima de tudo segue com a espada nas mãos lutando contra o inimigo 24 horas.

Protegida? Sempre. Ela é, posso ratificar, revestida na beleza da santidade de quem se batizou naquele 8 de maio de 2021 e permanece com a couraça da Justiça, equipamento este que compõe a armadura de Deus que todo cristão deve usar.

Mas hoje o dia amanheceu diferente. Minha menina faz aniversário. Moça linda e adorável que todo pai adoraria tê-la como filha.

Mas Deus me olhou, viu em mim um sujeito pecador e apontando o dedo em minha direção disse: "Filho, toma, é tua!".

Recebi minha vitória. Que honra! Que orgulho! Que bênção!

Mas desejo apenas que a aniversariante tenha desejos. Muitos. Milhares. E que sejam realizados!

Eu, seu pai babão e bobão, e sua mãe, puxa-saco, te amamos!

Feliz aniversário!

O Pelé na cobertura esportiva


Por Marcos Vinicius Cabral

Após sofrer infarto fulminante, Gilson Ricardo morreu na noite de domingo (22).

Morreu dormindo. E nunca dormiu nas coberturas esportivas em que participou.

Fosse na Rádio Difusora de Petrópolis, onde iniciou a carreira, na Bradesco Esportes, CNT, SBT, Bandeirantes e Rádio Globo por 35 anos, Gilson Ricardo sempre trabalhou com entusiasmo e fôlego de um garoto que sentia prazer nas coberturas em que era escalado.

Parte da minha infância vai junto com ele.

Poucas não foram as vezes que ouvi no rádio, Gilson Ricardo atrás do gol berrando no microfone:

"Ô, Bebetô! Ô, Bebetô!!! Para com isso".

Gilsão - como era chamado - não foi apenas um craque nas transmissões esportivas. Craques foram os outros. Gilsão foi gênio. 

Esse talentoso petropolitano está na prateleira dos grandes do jornalismo esportivo ao lado de nomes como Fiori Gigliotti, Waldir Amaral, Jorge Curi, José Silvério, Milton Leite, José Carlos Araújo, Washington Rodrigues, Doalcey Camargo, Galvão Bueno, Osmar Santos e Luciano do Valle.

Gilsão, Gilsão, Gilsão...

A Evolução da Comunicação nas Copas do Mundo, título que meu grupo de TCC produziu, me ajudou a conhecer pessoalmente Gilson Ricardo em 2017.

Gilsão foi o último a ser entrevistado por nós - depois de Washington Rodrigues e José Carlos Araújo - e confesso, foi o que mais arrancou risadas da gente. Das entrevistas, foi o material que mais rendeu.

Mas aquela tarde continua sendo inesquecível para mim e acredito que para meus colegas de faculdade.

Não só pela figura bacana que foi conosco naquela oportunidade, mas também pelo conhecimento sobre Copas do Mundo.

Gilsão, para quem não sabe, cobriu algumas e conversou por mais de uma hora conosco sobre o tema.

"A seleção de 70 é incomparável. Foi a melhor de todas. Mas o futebol arte não existe mais por causa da seleção de 82. Se o time de Telê ganha, até hoje teríamos magia nos jogos", revelou.

Sobre a Copa de 86 ele foi curto: "Foi uma sacanagem o que o futebol fez com Zico", disse referindo-se ao pênalti perdido contra a França.

"Pula essa. Terrível. E um dos piores mundiais", disse sobre 1990.

Mas passeamos por outras copas, mas essas três lembro com exatidão o que ele disse.

Trocamos números de telefones e meus textos sempre eram enviados para ele. Era curto e seco se não gostasse e sacana às vezes também.

Mas sempre dava uma opinião do que eu escrevia. O mais recente, um Flamengo e Botafogo, em que o goleiro Borrachinha, com defesas milagrosas apagou Zico & Cia com gol de Renato Sá em 1979.

Rubro-Negro e piadista dos bons, disse que no Rio só tem dois tipos de ladrões conhecidos de 'geraldinos' e 'arquibaldos': Sérgio Cabral e o Flamengo", contou dando aquela gargalhada e arrancando gargalhadas entre nós.

Era difícil falar sério com Gilsão. Mas conseguimos. E a banca nos deu a nota 10.

O radiojornalismo perde uma figuraça, mas acima de tudo um grande ícone do jornalismo esportivo.

No futebol que se joga no céu, Deus chamou Gilsão, um craque, para entrevistar outros tantos craques. Recentemente dois maiores camisas 10 do futebol mundial: Pelé e Roberto Dinamite.

Afinal de contas, de que vale uma bela partida no céu sem a cobertura de um repórter talentoso como Gilson Ricardo.

Não se faz mais artista como antigamente

Por Marcos Vinicius Cabral 

A frase "Por favor, deixem seus egos do lado de fora ao entrar", colada na porta do A&M Studios em Hollywood, na Califórnia, dava sinais claros que os 45 artistas que participavam da ação humanitária USA For África, tema da canção We Are The World, que completa 38 anos neste sábado (28), não estavam ali de brincadeira.

Composta por Michael Jackson e Lionel Richie e sob a batuta de Quincy Jones, a canção se transformaria em um hino até hoje lembrado.

Naquela noite, a partir de então, vidas foram mudadas com a arrecadação de milhões de dólares em prol da campanha.

Estou escrevendo sobre um marco musical histórico de 1985. 

Foi legal ver na abertura do clipe o globo terrestre girando, se transformando em um pano branco com letras garrafais escritas USA FOR ÁFRICA e os autógrafos das estrelas surgindo.

Mas foi legal ver também artistas da estirpe de Bob Dylan, Cyndi Lauper, Al Jarreau, Tina Turner, Billy Joel, Dionne Warwick e tantos outros, abraçarem a causa.

Bacana demais o dueto de Bruce Springsteen com Stevie Wonder e no final da canção a belíssima sonoridade com Ray Charles.

Boas ações pararam no tempo.

Décadas depois, os artistas não se movimentam por uma boa causa e o que mais se vê são cantores sem nenhuma relevância discursando nas redes sociais, principalmente no Twitter, sobre assuntos que desconhecem por completo.

E o pior é que, desta forma, não tem um ato altruísta para matar a fome de alguém e mudar a vida de ninguém.

Tudo é um ego somado à estratégia da assessoria de imprensa para maquiar a falta de talento, justificando a busca cada vez mais desesperada por holofotes e likes, muitos likes.

Já não importa o que você canta, mas sim a qual discursinho fajuto você está alinhado.

Bom, se no meio do Twitter, Instagram e YouTube surgir um novo Bob Dylan, um Kenny Rogers ou algo minimamente próximo de Michael Jackson, me avisem, por favor!

Até lá, fico assistindo de camarote a música empobrecida e artistas definhando em melodias pobres.