quinta-feira, 10 de março de 2022

QUANDO O FIM É O COMEÇO

 

Por Marcos Vinicius Cabral

17.02.19

 

Eram 13h50 quando entrei naquele lugar.

 

Debrucei-me sobre uma das janelas e observei o formigueiro de gente que passava nas ruas.

 

Sensação estranha, convenhamos, pois muitos lá embaixo e eu sozinho lá em cima.

 

Virei-me e de frente ao enorme vazio, comecei a pensar nos caminhos que o jornalismo está tomando com essa ferramenta chamada internet, atribuída ao inventor inglês Timothy John Berners-Lee, que é também físico e cientista da computação.

 

Visivelmente triste - na segunda-feira havíamos perdido Ricardo Boechat em um trágico acidente aéreo em São Paulo -, pois a solidão ao qual acabara de presenciar me devastara por dentro.

 

Sentado no chão, fechei os olhos e divaguei fatiando instantes em momentos vividos naquele lugar.

 

Todavia, sentí falta de muitas coisas nessas duas passagens pelo jornal de quase um século de existência.

 

Fui chargista dele de 1999 a 2008, e um de seus estagiários (ao lado de Laryssa, Paula e Kimberly), em 2016.

 

Notei a ausência do som dos telefones tocando, quando sempre chegavam denúncias de um (a) morto (a) e que teria a cobertura de uma equipe, independente do horário.

 

Um pouco mais à frente, à direita, na sala de escuta, uma saudade do repórter Augusto Aguiar, que ficava regulando o rádio de comunicação.

 

Lembrei-me da forma comprometida de Dayse, da inquietude da Sany, do faro por notícias de Jefferson, da simplicidade dos Antônios: Figueiredo (que caminhava com certa desenvoltura no terreno inóspito da Política de São Gonçalo) e Puga (que fazia a Geral).

 

Do saudosismo de Maurício Ferreira, Ricardo, Léo, Júlio Brazil e Assuéres, e enxuguei minhas lágrimas em uma das mangas da minha blusa.

 

Recordei-me de outras pessoas bacanas como Tatiane, Eloísa - chamada por mim carinhosamente de Heleninha, personagem de Renata Sorrah na novela Vale Tudo e que nos deixou recentemente -, Marcia Nascimento, o fotógrafo Sidney (que nunca mais tive notíciais), Marcos Sanches e Renato Seixas, que era para nós, o filho bastardo de Tiãozinho, o diagramador que reclamava de tudo e com todos

 

E por falar em Tião, lembrei das charges que fazia dele, assim como dos sambas que cantávamos juntos - muitos deles de Agepê e Benito di Paula - antes de desempenharmos nossas funções na empresa.

 

Não esqueci do sorriso de Ivan Roubier, da tranquilidade de Marcelo Benítez, do jeito calado de Edir Lima, da voz firme de Nelson Eiras e de Sérgio Meirelles, que bateram asas e voaram para céus de outros ares.

 

De Fabinho a Joubert, passando por Lili, Deork e Danoninho, seres com personalidades distintas e bons profissionais.

 

Dos malucos Alexandre Tavares e Ângelo Barsi, que já se foi deste mundo, que confundiam os sábios com suas esquizofrenias.

 

De dona Jean, de Dalma e de Robertinha, iniciando sua trajetória cobrindo Polícia e dos vascaínos que eu mais respeitava naquele lugar: Giovanni Pagotto, Henrique Morais e Gustavo Carvalho.

 

Veio-me à mente, o motorista Alexandre, vulgo Grilo, que várias vezes me chamava para tomar café na cozinha e xingava meio mundo em virtude de ter pauta quase na hora dele ir embora.

 

Já o Alexandre, o Braga, outro motorista, que sorria e fazia questão de me abraçar cada vez que me via.

 

Do Miranda, que chamava todos por Jogador e do tio Carlos, que me dava uns tapinha nas costas.

 

Do piloto de fuga Waguinho, que a cada saída era um teste para cardíaco. Quem nunca viveu essa louca experiência?

 

Também da calmaria de Adir, de fala mansa e olhar atencioso, que me chamava de "Meu bom".

 

Lembrei-me também de Delédio Santanna, que do jeito dele com histórias que rendiam boas gargalhadas.

 

De Riquinho que nunca mais vi e de Néris, que virou taxista.

 

Não deixei de lembrar dos esbarrões que os fotógrafos davam uns nos outros, na correria para descarregar o material fotográfico e irem embora para casa.

 

Alcyr e o falecido Jacozinho sempre eram os últimos, enquanto Sandro, Alex, Andréia, Robert, Ackermann e Aloíno, já haviam partido.

 

Pensei também em Marco Silva, que chamava todos por "Choque" e em Helvio, o botafoguense mais sarcástico que conheci na vida.

 

Até minha exposição individual de caricaturas no Flamengo eu lembrei, em que o Moskov fotografou e Patrick Guimarães fez a cobertura.

 

De Arthur Rosa e seu humor ácido, de quem perdia o amigo, mas não a piada.

 

Das partidas que valiam vale-transporte em que nós, eu e Renato Fonseca, jogávamos nas escadas do prédio, antes de descer para racharmos um angu à baiana.

 

Flávio e França, figuraças, quando líamos um para o outro os nossos poemas inspirados pelas canções de Renato Russo e Cazuza, nossos poetas da Geração BRock.

 

Do talentoso Carlos Brito com as palavras e que assim como eu, adora o Batman.

 

Do dedicado Rafael Casado, a quem ajudei a fazer a matéria do sequestro do ônibus 174, já que o Sandro Nascimento (não o excelente fotojornalista), era meu vizinho na rua em que moro até hoje.

 

Mas também lembrei de uma galerinha boa como Alexandre Recife, Marcelo, Marcela Freitas.

 

Saudades de ouvir "primeirinha, primeirinha, primeirinha", dita por Celso a Jorge, que era incumbido de fazer a capa, página considerada a mais importante do jornal.

 

De Waltinho, que subia do arquivo no sétimo andar e avisava que estava indo embora.

 

Ah, tantas e tantas e tantas saudades.

 

Lembrei Alan, fazendo macaquinho e Rogério com seu pragmatismo peculiar.

 

Do tricolor Ari, nosso editor e depois diretor e das conversas sobre coisas da vida. Mário, Natália e Dudu, estes dois estão juntos até hoje em nome do amor. Sem esquecer Cadinho e Beth.

 

Em um estalo, lembrei-me de Thiago Couri colocando o café no congelador para esfriar e apertando as orelhas de quem ele sentia vontade.

 

De olhos fechados, lembrei-me das charges finalizadas, quando ficava em cima de Júnior e PC para dar um tratamento no photoshop antes de ir à primeira e de Fábio Cotrin, que observava rindo por dentro o meu nervosismo.

 

Recordei Juliana, calmamente se despindo do crachá e o colocando em armário dela e de Kiko Charret olhando para trás desconfiado antes de descer.

 

Imaginei Wilton, Gil, Marcele, Roberta e Livia Mendonça - essa mesma que apresenta o Balanço Geral na Record - que faziam o Caderno de Modas e ficavam no fundo à esquerda, no cantinho mais disputado da redação.

 

De Thais Dias, hoje na TV Bandeirantes, que passou por lá, assim como Léo Barros, Flávio Amaral, Vivi Romero, Nathalia Nascimento e André Luiz Viannay.

 

Aparecida, Lázaro, Rosane e Arizete, essas duas, figuraças da limpeza.

De Rodrigo Fontes, que me chamava de "Cabeça", e de Fernandinha que me chamava carinhosamente por "Vini".

 

E lembrei de Simone Ronzani, de Simone Terra, de Rainer, e de Simoninha.

 

Pensei em Dalma, Viviane Biteti, no louco do Roberto Costa e em Ana Carolina - não a cantora mas a eficiente repórter -, isso sem Rafael de D'Angelo e a breve passagem dele.

 

Não esqueci também de Roberto Moreyra, Julio Diniz, Tiago do arquivo, de Izabel, Roberto e Júlio.

 

Lembrei-me do pessoal do comercial, chefiados por Luiz, botafoguense, mas apreciador do bom futebol.

 

Da galera mais nova como Thuany, Tiago, Dani, Filipe Aguiar, Ferraz, Renata Sena, Alex Ramos, Rodrigo Travassos, Silvia Jany e Stefanini.

 

Não deixei de fora das lembranças Mario Salgado, Marcelo Paranhos, Sérgio Renato e de Recife.

 

Outros tantos lembrei, no entanto, não recordei-me do nome.

Portanto, em 30 minutos aproximadamente, passou um filme na minha cabeça.

 

Ali, há bem pouco tempo atrás - não sei precisar ao certo - funcionava a redação do jornal O São Gonçalo.

 

Era uma quinta-feira, 14 de fevereiro.

 

Sobravam fios e faltavam pessoas.

 

Havia muita sujeira e um espaço sem vida.

 

Sonhos viraram pó.

 

Era um jornal e hoje não é mais.

 

Lembranças, por mais que dolorosas, são o que restam daquele lugar.


Um comentário:

  1. Não há mal que sempre dure, nem bem que nunca acabe. A vida é uma dinâmica para viver a cada momento com a maior intensidade possível. Belo texto.

    Grande abraço.

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